Blog para escrever o que se quer falar.
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Meu fantasma sem linha e os fantasmas em linha.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2017

Saudade sem rancor

Era a distância que mais nos aproximava: não os poemas, não as cinzas daquele cigarro inacabado. Todo amor exige certo distanciamento para ser lembrado em qualquer espaço de tempo, em qualquer pedaço de sentimento. Eu, para te ter, precisei te escrever. Só assim pude dormir tranquilo todas as noites que estivemos longe um do outro do outro do outro: sem ouvir o timbre da tua voz tão doce e tão delicada, sem tragar teus problemas tão doces e confusos, sem estragar teus dias tão delicados e breves. Só assim consegui domar a angústia que é não poder acariciar teu sorriso matinal, tua presença tardia e teu gozo noturno. E para não morrer de saudade, me alimentei das suas ausências: só assim pude digerir a angústia sem passar mal, sem rancor.

Saudade sem rancor.

(Eu nem chamo Antonio)

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

MINHA CONTRIBUIÇÃO PARA PRODUZIR INFORMAÇÃO (F) ÚTIL

Cooperatividade, cooperação, trabalho em equipe e todos os outros sinônimos para essas palavras ou expressões estão cada dia mais em evidência. Recordo-me dos findos dos anos noventa e princípio dos anos 2000, quando realizávamos trabalhos em grupo na escola com o intuito de aguçar a cooperação entre os colegas. O discurso dizia que o trabalho em equipe era fundamental ao desenvolvimento. Nunca discordei e nunca ei de discordar dessa afirmação. Pelo contrário, me faço totalmente adepto desta referência no que diz respeito à Web 2.0.
Tim O’Reilly (2005) diz que a Web 2.0 tira “partido da inteligência coletiva, transformando a web em uma espécie de cérebro global”. Intrinsicamente, fui inserido nessa nova corrente de comunicação sem que percebesse e hoje me faço presente, atuante e produtor em muitos dos inúmeros sites em que antes me fazia apenas consumidor. Inicialmente foram as redes de relacionamentos – que permanecem até hoje (atualmente 4 redes sociais em meu nome), apesar de ter migrado de uma para a outra -, depois, como espécie de repositório digital passei a usar o Flickr, Google Drive, Youtube, SoundCloud e Blogger. Utilizo todas essas plataformas como um drive seguro para o material que produzo, claro, aqueles em que não aposto comercialmente deixo livre para que qualquer um possa copiar, colar, plagiar e etc. Aqueles em que aposto comercialmente ou publicitariamente não deixo livre, mas à vista para que possam pesquisar meu nome. A relevância ou não dessa informação que jogo na web nunca foi parâmetro para filtrar as informações que produzo ou reproduzo de outros. O filtro que sempre busquei às minhas publicações era se aquele texto ou imagem não iria interfer na minha imagem real (não a virtual). Se o conteúdo não fosse vexatório, postaria sem medo. Acredito que o usuário deve fazer esse filtro e não, necessariamente, o produtor. Aquilo que pode não ser valorável para uns, pode ser de extremo valor para outros. O’Reilly nos apresenta em seu texto o que James Suriowecki chama de “a sabedoria das massas”, que aborda, dentre outros aspectos, que a “atenção coletiva da blogosfera seleciona o valor” das informações.

Não se trata de conhecimento especializado, mas sim de conhecimento comum. É, basicamente, um pouco do que sabemos sobre aquilo que estamos discorrendo; são observações superficiais sobre o mundo a nossa volta e não uma análise profunda, na maioria das vezes. Alguns defendem que são mais notícias menos confiável, informações inúteis e menos cultura. Desacredito, pois cultura – dentre as diversas formas de defini-la – são as manifestações de um determinado povo, de uma determinada geração ou grupo social.
Nesse sentido, a alta produção de informação (útil ou fútil), a própria web 2.0. é – ou virá a ser -  uma forma cultural de nosso tempo. Os produtores de informação ultrapassam 100 milhões de blogueiros, todos falando simultaneamente sobre si mesmo, assim como essas poucas linhas que acabo de redigir. E viva a possibilidade da Web 2.0., um salve a democratização e produção de informação, seja (f)útil ou não.

terça-feira, 9 de junho de 2015

Amém. Amem - uma reflexão sobre Viviany, a travesti amarrada na cruz durante a parada gay de São Paulo

Amigxs, me considero um cara mega feliz por conseguir manter relações ecléticas em minha vida. Tenho grandes amigos de direita e esquerda, heteros e homossexuais, empregados e desempregados, profissionais e estudantes, da classe A, B, C... Z, grandes amigos ateus, cristãos, não cristãos. Respeito todos, mas isso não significa que não vou me expressar sobre aquilo que defendo. Então, de antemão, peço licença para escrever sobre a travesti e sua cruz. E gostaria de todxs amigos, cristãos ou não, lessem.

Viviany, travesti, seminua, exposta, sangrando cenograficamente, amarrada num cruz, crucificada. Não é um ataque aos cristãos, é um pedido de socorro: a travesti que choca a todos é a que está contracenando inspirada num cara que morreu da mesma maneira em prol dos oprimidos de seu tempo. Tantas outras travestis morreram da mesma forma: braços abertos, mutiladas, atiradas em qualquer mato, morreram espancadas por falta de respeito e de oportunidade, morreram em virtude da violência cotidiana. Tantas travestis e gays morreram e estão morrendo pela soma das violências que sofrem diariamente e durante a sua vida inteira. Morreram e morrerão por culpa da sociedade transfóbica em que são obrigadas a viver. Esses que morrem diariamente crucificadas de verdade, espancadas e mutiladas não são objeto de protesto de pessoas “do bem” que estão ofendidas com a performance da travesti que segue viva e lutando todos os dias para seguir... viva. Mas porque usar a cruz? A cruz que Viviany está amarrada simboliza a homofobia.

Por vezes me questiono e me revolto com a falta de noção que alguns líderes religiosos conservadores usam as histórias da Bíblia como bem entendem; por vezes ignoram partes e supervalorizam outras (convido TODXS a ler o livro Levitico), com o propósito de arrecadação de manipulação. Mas o mais absurdo é ver que aquele homem (real, Jesus existiu!) que estendeu a mão aos excluídos, hoje tem seu nome usado pra excluir. Se Jesus existisse fisicamente nos dias de hoje ele seria um grande amigo dos gays, transexuais, dos torturados pela ditadura, dos escravos, dos negros, das mulheres oprimidas. Seria um ativista. Em sua rede social certamente teria textos de apoio às “minorias”. Acham que isso é bobagem? Pois quem conhece a Bíblia deve lembrar que Jesus Cristo pregava o amor, acima de tudo. Devem lembrar que Jesus Cristo salvou Maria Madalena, UMA PROSTITUTA, do apedrejamento. Jesus, o homem, nos ensinou (àqueles que aprenderam) que todos ser humano peca e que atire a primeira pedra quem nunca pecou. Condene alguém ou algo, atire uma pedra (literalmente ou não), mas antes olhe para o próprio umbigo. Jesus pedia respeito e amor. Como postou um amigo meu, “se olharem de pertinho, a gente [os gays] se parece mais com ele do que vocês [os cristãos]. Nosso amor, assim como o dele, é ato político. É libertador”. Assim como Jesus, defendemos o amor. Queremos amar e ser amados acima de tudo.

Finalizo com parte de um texto de Fábio Chap, compartilhado no Facebook: “quero enfatizar - quase gritar - que Jesus disse ‘AMEM’, e isso é muito, mas muito maior que ‘AMÉM’. Então, peço licença de todos credos e não-credos pra fechar esse texto reproduzindo essa fala tão poderosa desse cara tão maneiro: Amem. Amem pra caralho”.

(Jonas Ferrigolo)

segunda-feira, 25 de maio de 2015

[sem rancor; antônio]

Era a distância que mais nos aproximava: não os poemas, não as cinzas daquele cigarro inacabado. Todo amor exige certo distanciamento para ser lembrado em qualquer espaço de tempo, em qualquer pedaço de sentimento. Eu, para te ter, precisei te escrever. Só assim pude dormir tranquilo todas as noites que estivemos longe um do outro do outro do outro: sem ouvir o timbre da tua voz tão doce e tão delicada, sem tragar teus problemas tão doces e confusos, sem estragar teus dias tão delicados e breves. Só assim consegui domar a angústia que é não poder acariciar teu sorriso matinal, tua presença tardia e teu gozo noturno. E para não morrer de saudade, me alimentei das suas ausências: só assim pude digerir a angústia sem passar mal, sem rancor.

[sem rancor; antônio]

Extraído de https://www.facebook.com/eumechamoantonio/posts/578225125575077

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Uma vez fui viajar e não voltei, de Marcelo Penteado

Uma vez fui viajar e não voltei.
Não por rebeldia ou por ter decidido ficar; simplesmente mudei.
Cruzei fronteiras que eu nunca imaginaria cruzar. Nem no mapa, nem na vida. Fui tão longe que olhar para trás não era confortante, era motivador.
Conheci o que posso chamar de professores e acessei conhecimentos que nenhum livro poderia me ensinar. Não por serem secretos, mas por serem vivos.
Acrescentei ao dicionário da minha vida novos significados para educação, medo e respeito.
Reaprendi o valor de alguns gestos. Como quando criança, a espontaneidade de sorrisos e olhares faz valer a comunicação mais universal que há – a linguagem da alma.
Fui acolhido por pessoas, famílias, estranhos, bancos e praças. Entre chãos e humanos, ambos podem ser igualmente frios ou restauradores.
Conheci ruas, estações, aeroportos e me orgulho de ter dificuldade em lembrar seus nomes. Minha memória compartilha do meu desejo de querer refrescar-se com novos e velhos ares.
Fiz amigos de verdade. Amigos de estrada não sucumbem ao espaço e nem ao tempo. Amigos de estrada cruzam distâncias; confrontam os anos. São amizades que transpassam verões e invernos com a certeza de novos encontros.
Vivi além da minha imaginação. Contrariei expectativas e acumulei riquezas imateriais. Permiti ao meu corpo e à minha mente experimentar outros estados de vivência e consciência.

Redescobri o que me fascina. Senti calores no peito e dei espaço para meu coração acelerar mais do que uma rotina qualquer permitiria.
E quer saber?
Conheci outras versões da saudade. Como nós, ela pode ser dura. Mas juro que tem suas fraquezas. Aliás, ela pode ser linda.
Com ela, reavaliei meus abraços, dei mais respeito à algumas palavras e me apaixonei ainda mais por meus amigos e minha família.
E ainda tenho muito que aprender.

Na verdade, tais experiências apenas me dirigem para uma certeza – que ainda tenho muito lugar para conhecer, pessoas a cruzar e conhecimento para experimentar.
Uma fez fui viajar…

e foi a partir deste momento que entendi que qualquer viagem é uma ida sem volta.

(Marcelo Penteado)
                                        
                                                 Caminho Inca a Machu Picchu - Peru - Jan. 2014


quinta-feira, 14 de maio de 2015

Um dia tive um sonho. Era o amor.

Um dia tive um sonho: eu estava numa balada qualquer, numa cidade qualquer. Beijando todas as bocas pertencentes a olhos que me tivessem visto. Nenhum daqueles beijos era doce. Era apenas o desprendimento de um amante inveterado doido para encontrar outro amor igual. As luzes da balada giravam rapidamente, a música era pop e meu corpo se balançava como se eu estivesse dançando sozinho, sem ninguém me vendo. Num dos giros de 90 graus da minha cabeça tive que parar: era a visão mais linda daquela noite de beijos indesejados. Você chegou mais perto e passou a ser os olhos mais lindos que aquela noite tinha me mostrado. Perguntou meu nome. Eu disse que não importava. A única coisa que importava era te beijar. Queria que fosse o mais doce que pudera ter provado. Ao se aproximar mais e propor - apenas com os olhos e movimento de cabeça - que queria me beijar, instantaneamente disse que seria para sempre. Eu sonhara com um beijo eterno de “três mil horas para parar de me beijar”. Sem pestanejar, me beijou. Precisávamos somente de “um segundo para aprender a [nos] amar”. Foi um soco. Foi um pontapé na porta. 

Gentlemen, start your engines, the time is coming. O amor chegou, cegou.

Uma noite fria em que o termômetro marca 17 graus Celsius. Meu coração está com 37 graus. O esperado para um corpo sadio. O amor de sempre que aquece meu coração. O tempo cronológico do nosso amor foi curto. Tão curto que nem deu tempo de contar. Mas o tempo do amor foi longo. O relógio pareceu parar para nós dois. Tínhamos o toque, o beijo, o olhar, o cuidado. Fomos testemunhas de acontecimentos particulares que abrimos um para o outro. Meu ombro foi testemunha de teu choro e de tua confiança. Acho que nesse momento amei mais. E talvez tenha sido esse momento que te fez fugir do nosso amor. Um contrassenso, parece. Não sei. Até agora não entendi porque teu coração deixou de se aquecer por mim. Às vezes penso que ele não deixou. Tudo o que eu queria dizer era “você não deve ficar triste em me perder, mas deve estar consciente de que está desperdiçando um amor”. Mas não tive coragem. Soaria prepotente, eu sei. Nosso amor chegou na hora em que o coordenador diz “Shantay, you stay ; Sashay away”. E cada um foi pro seu lado. Com o coração ainda quente.


Dias depois, você me pergunta o que mais eu quero. E eu só queria um pouco (quase nada) e amor. Talvez uma mensagem dizendo que sente saudades, ou uma margarida seca entre as páginas de um livro, ou um simples bilhete escrito num guardanapo qualquer com um trecho de qualquer música do nosso ídolo, o Cazuza; ou passear de mãos dadas na praia. Mas teu amor anda sem tempo. Nem pra escrever "sdd". Nem pra dizer boa noite. Do nada surge um cupido na minha frente e grita “Oléé”. Daí eu acordei. Foi tudo um sonho. Não estamos mais na praia de mãos dadas. A verdade é que o amor é uma exceção. E não há doçura ou amargura que faça isso ser diferente.

Praia do Cabeço - SC

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Estou louco de amor

            Descobri que não sou disciplinado por virtude, e sim como reação contra a minha negligência; que pareço generoso para encobrir minha mesquinhez, que me faço passar por prudente quando na verdade sou desconfiado e sempre penso o pior, que sou conciliador para não sucumbir às minhas cóleras reprimidas, que só sou pontual para que ninguém saiba como pouco me importa o tempo alheio. Descobri, enfim, que o amor não é um estado da alma e sim um signo do zodíaco.
           Virei outro. Tratei de reler os clássicos que me mandaram ler na adolescência, e não aguentei. Mergulhei nas letras românticas que tanto repudiei quando minha mãe quis me forçar a ler e gostar, e através delas tomei consciência de que a força invencível que impulsionou o mundo não foram os amores felizes e sim os contrariados. Quando meus gostos musicais entraram em crise me descobri atrasado e velho, e abri meu coração às delícias do acaso.
              Me pergunto como pude sucumbir nesta vertigem perpétua que eu mesmo provocava e temia. Flutuava entre nuvens erráticas e falava sozinho diante do espelho com a vã ilusão de averiguar quem sou. Era tal meu desvario, que em uma manifestação estudantil com pedras e garrafas tive que buscar forças na fraqueza para não me colocar na frente de todos com um letreiro que consagrasse minha verdade: Estou louco de amor.

Trecho de Memória de minhas putas tristes, de Gabriel García Márquez